sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

the londoner #17


Sexta de manhã meu celular não despertou. Isso já havia acontecido outras vezes quando eu não tinha trabalho, eu sempre colocava o celular no silencioso no dia anterior, e no outro dia ele não tocava porque eu o havia esquecido assim. Mas o marquinhos acorda às 5 da manhã para ir limpar uma escola, e sempre volta pelas 9 e pouco, e eu estava marcado para trabalhar às 10 no St. Martin’s Lane hotel, um hotel próximo à Leceister Saquare.

Me levantei correndo nem tomei banho me joguei nas roupas e nove e meia já estava na estação do DLR. Às 10 em ponto eu cheguei na estação de Leceister Square, mas ainda faltava descobrir onde ficava exatamente o hotel, e mesmo em posse de um mapinha que John havia impresso para mim, eu ainda tive que bater um pouco até encontrá-lo, porque claro, o prédio nem nome tem.

Entrei e fui logo na recepção perguntando por Dagmara, a gerente do hotel à quem eu deveria procurar. Mas estavam todos ocupados na recepção, e eu angustiado, já pensando em que problemas teria por estar chegando atrasado. Era a primeira vez que eu me atrasado para um trabalho aqui em Londres, mas nos outros lugares onde eu tinha ido, eu não tinha visto muito controle de chegada e saída, então apesar dos temores que me causavam a famosa pontualidade britânica, Dagmara não parecia ser um nome britânica de qualquer forma.

Eis que vem apressadinho um rapaz magro de terno e nariz pontiagudo e um rabinho de cabelo na nuca me cumprimentando muito simpático e me levando até a cozinha. Seu nome era Rafael. Lá na ante-cozinha dou de cara com o Wellington, o mesmo da noite anterior, e ficamos por lá só polindo pratos. Ninguém falou nada do meu atraso.

O hotel é muito bonito, muito mesmo, com uma típica decoração que eu acho incrível em ambientes privados e completamente desprezível para fazer mostras em museus de arte moderna. Ele é de uma rede estadunidense de hotéis e se auto-proclama “um museu em estilo nova-iorquino no centro de Londres”.

O Rafael foi também completamente simpático, sempre me mostrando onde estava o que ele me pedia, e me mostrando como fazer o que ele queria que eu fizesse. Arrumamos as mesas com suas toalhas, talheres, taças e copos. Ele pediu ainda que colocássemos umas mesas e cadeiras do lado de fora do hotel. Era um estúdio, que podia ser dividido em dois, e que era alugado para empresas para eventos. Naquela sexta seria o almoço de natal de uma empresa.

Cada lugar diferente tem suas especificações e detalhes diferentes, e mesmo no geral o grosso ser igual, trabalhar assim por agência acaba nos fazendo se sentir sempre perdidos e no primeiro dia de trabalho, por sempre estarmos tendo que trabalhar em lugares diferentes. Mas isso pelo menos gera mais experiência, então no fim das contas é uma coisa boa.

O almoço deste hotel servido para os funcionários era um salmão com molho de alcaparras e umas batatinhas assadas, um dos meus melhores almoços em Londres e que sempre me levam a sonhar em trabalhar num hotel como esses.

O almoço seguiu uma cartilha não muito diferente, e foi até mais fácil porque desta vez os pratos não eram individuais, e as pessoas servir-se-iam elas mesmas. Perto da hora do almoço apareceram outras pessoas que trabalham fixo ali no hotel, entre eles uma brasileira, Samantha, que mora em Londres há três anos com cidadania italiana. O Wellington mora aqui há tr6es anos também, também cidadão italiano, e trabalha como sushi-man é um restaurante perto da catedral de St. Paul. Ele está de férias, e por isso resolveu ganhar um dinheiro extra trabalhando com o John.

No começo do almoço, o Rafael me colocou no Coatroom, onde eu ficava pegando os casacos das pessoas e guardando, um trabalho um tanto monótono mas bem razoável de se fazer, ao menos eu ficava sentado. Uma certa hora apareceu uma moça loira de cabelos curtos muito bonita e com um ar de superioridade ocupada meio intimidador, me cumprimentou com um sorriso e disse que seu nome era Dagmara e logo saiu apressada.

O evento ocorreu sem maiores percalços, e quando já estávamos limpando a Dagmara me interpelou perto das escadas e perguntou foi você quem chegou atrasado? Eu disse, err, sim, dez minutos atrasado. Ela disse dez minutos não, vinte, eu sei porque eu vi quando fulana da recepção ligou perguntando por mim. Então eu disse mas ela estava no telefone... E ela me cortou com rispidez: não por dez minutos. Eu fiquei calado com ar contrariado e ela perguntou porque o atraso? Trabalhou até tarde ontem? Foi pra farra ontem? Dormiu demais ou só é irresponsável? Eu disse que nenhuma das opções, eu só havia calculado errado o tempo que me levaria para chegar ao hotel, e havia perdido mais um tempo para encontrá-lo, já que ele não tinha nome sequer. Ela disse tudo bem então, porque esta é sua primeira vez aqui de qualquer forma, mas saiba que esse tipo de comportamento eu não tolero uma segunda vez, e como você chegou com 20 minutos de atrasado e deve ter gasto ao menos 10 para se trocar e se arrumar você vai ter menos meia hora de pagamento.

Eu fumaçando, mas incapaz de responder alguma coisa, saí andando sem nem olhar para o rosto dela, e acabei não dizendo que eu tinha chegado já pronto, nem me trocado tinha. Mas tudo bem, depois a Samantha me disse que ela nem era tão chata com outros erros, mas atrasos eram intoleráveis para ela. Tanto a Dagmara quanto o Rafael, assim como os outros garçons do hotel à exceção da Samantha eram todos poloneses e assim finalmente eu pude ver a tão comentada invasão polonesa à Grã-Bretanha, são mais de 8 milhões de poloneses aqui.

Mas eu queria sair cedo e pegar meu cheque com o John, afinal eu ainda não tinha recebido nada aqui em Londres então pedi ao Rafael para sair às 17 horas, e assim o fiz. Fui correndo até o John, que me deu meu cheque feliz de 150 libras, nada mal para apenas três dias de trabalho, já que aquele pagamento correspondia ao pagamento dos trabalhos efetuados na semana passada da segunda ao domingo. Mas era tarde demais para trocar o cheque por dinheiro, então fui pra casa.

Neste dia mais tarde, finalmente falei com o Ed, o terceiro brasileiro e último que me faltava conhecer aqui, e depois de marcar de encontrá-lo na estação de Tottenham Court Roas seguimos eu, ele e Carla para um pub perto de Trafalgar Square, onde estavam Filipe, seu amigo Ingo de Curitiba, mais um outro brasileiro e três colombianos. Mas como o pub fechou às 23h, de lá vagamos pelas ruas e fomos ainda para um outro pub mais tarde. O pessoal todo muito simpático e divertido, acabamos ficando até quase 4 da manhã na minha noite mais divertida em Londres. Parecia que finalmente as coisas aqui estavam começando a funcionar.

Mas sábado de manhã eu tinha marcado às 10 da manhã com o David na estação de Green park!!! O Davi é meu professor de inglês aí no Brasil, que está aqui em Londres até janeiro. E eu não podia me atrasar ou dar um bolo nele, pois nem celular ele tem. Então as nove e meia, não sei como nem com que forças ou responsabilidade lá estava eu na estação de Westferry, esperando meu trem. Cheguei pontualmente às 10, mais britânico impossível, e logo o encontrei lá fora no frio, e ele já começou rindo de minha cara de maceioense perdido numa manhã gelada. Foi muito bom encontrar alguém de Maceió, mesmo ele nem sendo de Maceió, mas como ele estava com um bronzeadinho de sol no rosto ainda e eu sempre o tinha visto e encontrado em Maceió, deu para matar um pouco das saudades.

Passeamos pela rua e depois pelo Hyde Park – que eu ainda não conhecia – e terminamos o passeio no memorial da princesa Diana. Nos despedimos sem adeus pois ainda nos veremos em Janeiro, antes de ele voltar para o Brasil. De lá eu fui logo ligando para o Filipe, pois que ele havia marcado um churrasco curitibano na casa dele para todo mundo no sábado, mas como ele não me atendeu e eu deduzi que ele dormia, voltei para casa.

Mais tarde acabei indo lá na casa do Filipe e me apaixonei, quero uma daquelas agora. É zona 1, em Bayswater, ele mora só com australianos numa casa grande, com uma sala super aconchegante embaixo, com as paredes cobertas por cartazes de filmes e fotos divertidas, e de três andares. Ele divide quarto com o Ingo, que é um amigo dele lá de Curitiba com quem ele veio junto, e mais um australiano, e paga só 65 libras por semana. E conseguiu pela internet, sem indicação. Desde então que eu quero uma dessas também.

Mas eles estavam meio paradões, e então eu e Carla fomos a uma boate onde o Ed estava com uns amigos brasileiros. E nossa, aqui a música é sempre boa, mesmo, mesmo quando é uma rádio qualquer tocando, mesmo quando é um som ligado na rua, e música sempre me agrada. Musicalmente, eu estou no lugar certo. E nessa boate não foi diferente, o lugar era legal mas nada de especial, e bem pequeno, e apesar de de graça, e de ter um brasileiro no coatroom de lá que guardou nossos casacos de graça, o fantástico do lugar foi mesmo a seleção de músicas, perfeita.

Domingo por fim foi o primeiro dia que acabei ficando em casa o dia inteiro, dominado pela preguiça e pelos primeiros sinais de uma doença que se manifestava. A Carla, depois de trabalhar a quinta-feira o dia inteiro, primeiro na universidade, e depois lá no oriental club acabou não conseguindo acordar na sexta de manhã e desesperada ouviu um sermão do John dizendo que ele não iria mais trabalhar lá. Desesperada ela foi no John pessoalmente, mas ele foi simpático e colocou nós dois para trabalhar lá na segunda-feira de noite, e pediu que eu fôssemos lá na segunda à tarde para ele nos colocar para trabalhar nos outros dias da semana.

Mas na segunda eu já acordei meio assim com dor-de-cabeça de gripado, e depois que a Carla me ligou dizendo que não iria trabalhar porque ficou com vergonha de trabalhar no oriental club depois de ter feito tanta coisa errada no outro dia eu pensei que eu também estava sem condições de trabalhar. E foi só sair no frio lá fora para meu pensamento se tornar uma conclusão.

Mas e agora? Como iria eu dizer ao John que eu não iria trabalhar? Eu e Carla? E ainda assim tão em cima da hora?

Já que eu estava vestido e no trem, resolvi ir lá pessoalmente, com a maior honestidade e com minha garganta doendo, pedir desculpas e dizer que eu até achei que dava pra ir, por isso estava todo pronto e no caminho só com o vento gelado na minha garganta eu vi que não tinha condições. A Carla mandou uma mensagem.

Subi lá morrendo de vergonha, e para meu terror eu tinha uma grande platéia de brasileiros, que incluía inclusive o outro Douglas, todos em pé no aperto que é aquela sala. Cheguei logo dizendo tudo e fiquei calado esperando uma reação. O John estava muito ocupado com os dois celulares e falando com a única funcionária dele, uma estrangeira do sotaque carregado, e depois de me ouvir continuou da mesma forma ocupada mas agora com um semblante de desgosto. Eu fiquei lá em pé imóvel esperando algo que eu não sabia o que era. Os outros brasileiros – porque o John parece só contratar brasileiros – estavam lá papeando e querendo me incluir na conversa, mas eu tentei ficar calado o máximo que pude. Depois de muito tempo o John olhou pra mim e disse com uma certa rispidez que tudo bem, que eu já podia ir, que ele já tinha resolvido. Então quando eu estava abrindo a porta ele perguntou mas a Carla vai não é? Eu parei alguns segundos criando forças para me virar e disse eu não sei, ela me disse que ia mandar uma mensagem para você avisando que não poderia ir. Ele explodiu, começou a brigar que um ele podia substituir, mas dois não, e eu no meio da gritaria disse que ia ligar para ela, e quando ele ainda parecia que ia gritar por muito tempo que era bom mesmo que eu fizesse isso eu fechei a porta e saí desolado, me sentindo mais uma vez desempregado.

E em casa doente entrei e pensei que não mais sairia. Sozinho e doente, sem dinheiro e sem emprego, eu fiquei só sentindo saudades e sem entender o que eu estava fazendo aqui. Mas estando em casa eu interagi um pouco mais com o Marquinho pelo menos, que me disse que ele é quem tinha desistido de ir trabalhar no Mark no dia em que eu fui chamado às pressas, porque ele não suportava a grossura do Mark, nem simpatizada muito com a da Dagmara, mas disse que todos os outros clientes do John têm gerentes mais simpáticos. A Núbia – outra moradora da casa – então pediu que eu tirasse minha coisas de cima da cama eternamente desocupada do meu lado que eu já havia incorporado à minha existência nesse quarto, porque o outro morador já tão esperado finalmente chegaria, chegaria no outro dia. Ai, eu que já tinha me acostumado à morar praticamente sozinho aqui neste quarto, já que o marquinho coitado trabalha dia e noite fazendo eventos do John e nuns dois empregos de cleaner fazendo faxina em escolas. Agora eu teria que aprender mesmo a dividir o quarto, mesmo porque o tal morador novo iria chegar aqui do nada desempregado e sem ter o que fazer. Se eu achasse ao menos uma casa legal como a do Filipe...

E na terça quando eu acordo ainda mais doente o Stefano já tinha chegado. Vindo direto da Itália, com seus 2 metros de altura (literalmente), ele chegou e foi se ajustando com simpatia. Mas eu estava semi-vivo só de doente, e fiquei assim de cama praticamente sem sair pelos próximos dois dias, ao que imagine que o Stefano deve ter pensado que ou eu era um vagabundo ou alguém sem vontade de viver. Neste meio tempo a Carla foi no John e ele deu mais trabalhos à ela e disse que tinha uns para mim também. E ele me ligou várias vezes que eu não atendi.

Já na quinta à noite, me sentindo melhor fisicamente e cada vez pior mentalmente, finalmente eu o atendi e ele queria que trabalhasse na quinta mesmo, e depois de eu ter recusado, ele ainda me jogou para trabalhar na sexta logo cedinho no St Martin’s Lane Hotel, o mesmo da Dagmara, logo cedinho, e eu acabei aceitando.

Mas eu estava sem conseguir dormir à noite nestes dias de cama, e eu tinha que acordar entrar no hotel às 8 da manhã. Claro que eu não conseguir pregar o olho um segundo sequer, e 15 para as 8 já estava lá no hotel para nem dar chance à Dagmara de me reclamar de nada.

Mas eu não poderia ter tido sorte melhor. Todos os anos, os mais altos gerentes do hotel fazem um almoço de natal onde eles servem todos os funcionários, dos lixeiros e camareiros aos cozinheiros e telefonistas. Então o trabalho foi uma diversão. Seria tipo Buffet o almoço, então não tinha muito trabalho mesmo. Fui de novo guiado pelo Rafael, já que a Dagmara chegou só mais tarde. A única outra sortuda enviada pelo John foi Lulu.

Mas o clima era maravilhoso, se confraternização, e depois de garantir que todos tinham bebida à vontade eu e Lulu também entramos na fila e fomos bem servidos e comemos muito bem. Só não comi melhor porque a comida aqui realmente é ruim, mesmo essas dos jantares e almoços mais finos é geralmente estranha e não me agrada muito. Mas eu comi camarão acebolado muito feliz, nas companhias simpáticas de Samantha e do Rafael e até de uma Dagmara que tentava ser simpática – sem conseguir muito.

Saí de lá muito feliz, do melhor emprego que já tive aqui e fui lá no John pegar meu cheque. Só tinha eu lá e conversei muita simpaticamente com o John e com a Sylvia, e eu tenho a sincera impressão que ele gosta de mim, apesar dos pesares. Ele me ofereceu trabalho para o ano novo, para ganhar 9 libras das cinco à meia noite, e 12 de meia noite às cinco da manhã. Apesar do dinheiro irresistível eu recusei muito docemente, dizendo que com era meu primeiro réveillon aqui, e provavelmente meu último por um tempo indeterminado, eu ia querer aproveitar. Mas ele disse que eu passasse lá depois de 2 de janeiro, que ele disse que apesar de ser um mês mais calmo tem eventos sim e ele arranjava alguma coisa para mim. Voltei para casa sem me sentir tão desempregado como esperava, mas ainda sem saber como faria para sobreviver até janeiro, já que todo o dinheiro do cheque que eu tinha em mãos estava já comprometido.

Um comentário:

Anônimo disse...

realmente, sempre parece q o trabalho eh diferente do outro e vc fica perdido, mas como vc mesmo disse eh bom pra experiencia neh... nossa, com esse post agora eu achei q vc tah cada vez mais ajustado aí, menos perdido e mais feliz, apesar dos pesares.

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