segunda-feira, 19 de novembro de 2007

The Londoner #4

A primeira linha do metrô de londres começou a funcionar em 1863. O metrô aqui não é um adendo moderno da cidade, ele, em muitos termos, cresceu junto com ela. É por isso que "minha" linha, a victoria, que vai do sul até minha casa passando pelo centro é tão tosca. O vagão do metrô em uso agora nesta linha é de 1960, então ele é apertado e bem breguinha, duas filas de assentos uma defronte da outra e quase nenhum espaço no corredor no meio. O túnel é bem pequeno, bem circular, um tubo mesmo, e o vagao passa quase rente às paredes. A sensação é mesmo a de estar em filme de ficção científica da década de 70, numa cápsula em direção ao centro da terra. Mas não é só a minha linha, em geral aqui as linhas de metrô são muito estranhas, elas se bifurcam, abrem-se em duas, três e voltam-se a se encontrar mais adiante, ou ainda, o que eu viria a descobrir segunda-feira de manhã, no caminho da minha escola, várias linhas diferentes usam os mesmos trilhos.

Depois de me perder um tanto, cheguei no que eu julgava ser a estacão de metrô mais perto da minha escola, e se antes eu achava que já tinha visto muitos árabes em londres, era porque não havia visto a whitechapel street. Eu havia saído de debaixo da terra bem no meio do paquistão. Todas as mulheres usavam véu, muitas usavam burca! (coisa que nunca tinha visto antes) e eu estava no meio de uma feira de rua só com barracas árabes, todas tocando música árabe, e vendendos burcas e turbantes, em frente a uma mesquita gigante, e perto de lojas que vendiasm comidas e mais artigos árabes e até bancos só para ábares feitos por árabes.

Então eu saí como sempre sem mapa me batendo perguntando a todos que encontrava onde era a brick lane e todos me dizendo que era ali em frente à direita. Mas como eu confirmaria nos dias seguintes, não é só o metrô de londres que é estranho, as ruas daqui, além de serem enlouquecidamente tortas, mudam de nome o tempo inteiro sem motivo aparente. Algumas duram só uma quadra com o mesmo nome, e isso serve até para as ruas maiores e mais "principais". Eu cheguei numa rua maior que as outras, e então pensei estar já na brick lane, pois que não bastasse o que eu acabei de afirmar, aqui nas esquinas não têm placas dizendo o nome das ruas. Pois é. Algumas ruas tem seu nome gravado na parede de alguma casa, mas nem sempre.

Lá fui eu procurar o número 93, quando de repente pula do 89 para o 103. Ai ai. Entrei numa loja qualquer e perguntei pelo número 93, e o árabe que nem sei se me entendeu direito - eu sei que não entendi direito o inglês dele - disse que brick lane não era aquela rua, que era para o outro lado, ou seja, eu tinha passado pela rua e não tinha percebido. Mais tarde neste mesmo dia eu descobriria que tinha passado por ela porque na quadra onde ela nasce, isto é, na primeira quadra da rua, e somente nela, a rua tem outro nome, osborn street. Londres londres.

Então que finalmente eu chego no que seria a brick lane e me dou de cara com uma placa de nome da rua escrita em nepalês. Nepalês. E o cheiro, a cara das pessoas, as lojas, a língua dos letreiros, e sobretudo o cheiro da rua - que sim, era toda formada de bricks (tijolos) - era tão fortemente nepalês que eu mal podia acreditar, pis é, eu havia cruzado a fronteira do paquistão com a índia e bless (abençoada seja) a colonização britânica.

A rua é super estreita, do tipo que só dá para passar um carro, mas ela é também bem famosa aqui, como o reduto nepalês, tanto que tem um filme em cartaz aqui chamado brick lane, que é sobre o amor perdido de uma nepalesa ou algo do tipo. Mas eu estava procurando por uma escola de inglês, e sendo ali naquela rua, não podia ser grande coisa.

Acabei encontrando a escola, que fica no quarto andar de um prédio comercial, a visa lá de cima é muito bonita, de uma área de londres que parecia não ter sido tão legal 20 anos atrás. Eu chamo de escola para facilitar, porque na verdade eu não deveria, a pro & pro school of english and computing, consiste em 3 salas alugadas deste andar, que o insuportável dono indiano dividiu com aquelas divisórias de escritório em salas e recepções. Eu fiz um teste de inglês babaca no computador de lá e me colocaram na turma "advanced", a mais alta que eles têm lá. As aulas são das 15h30 ãs 18h30, e como ainda eram 13h30 e eu tinha um dossiê para terminar e enviar para paris ainda naquela tarde, comecei a usar um dos dois computadores que estão lá à disposição dos alunos.

Não tinha flash, não tinha impressora, eu comecei a me desesperar, saí e entrei numa lan house de nepaleses ali mesmo na brick lane, lan house muito boa por sinal, computadores novos e bem equipados,e barata, só 50p pela hora. Mas os donos não sabia nem falar inglês direito. Enfim, fiz as cartas de qualquer jeito, imprimi lá mesmo, me sentindo muito mal com a idéia de estar desperdiçando uma oportunidade de bolsa de estudos para a frança assim de qualquer jeito e saí correndo feito louco atrás de um post office (correio) para enviar com urgência a carta para paris, já que a data limite era dia 20, e já era o dia 19.

Quando achei o post office, vi na fila que eu nem tinha comprado envelope, nem tinha caneta comigo para assinar todos os documentos, mas como o post office ficava dentro de uma papelaria, comprei lá mesmo o envelope e a indiana simpática-tiradora-de-onda me emprestou uma caneta. E mais de qualquer jeito ainda, enviei o dossiê para paris, ainda em choque de ter pago 34 libras pelo envio, dinheiro que eu não tinha planejado gastar. Fiquei mal, muito mal, me senti um idiota e irresponsável que estava jogando as oportunidades no lixo, pois o cara do correio - super antipático aliás - me disse que era até dois dias até chegar em paris, mesmo eu pagando aquele preço. Agora não há mais o que fazer, é esperar e ver, e chorar, claro.

Voltei já bem atrasado para a aula, eram mais de 16h já, devidamente escuro (aqui começa a escurecer äs 15h20), e entrei morrendo de vergonha numa sala minúcscula, apertadíssimo, e com 40 carteiras pequenas abarrotadas. Só para chegar lá no fundo da sala eu arrastei metade das pessoas comigo, e só pelo olhar do professor eu já senti que ele seria insuportável. E ele é, ele não é um professor ruim, pelo contrário, ele parece ter muito conhecimento, e eu muito me impressinei com a explicação etmológica dele para a origem da palavra posh (que tem a ver com a não existência do canal de suez e as pessoas ricas que iam de navio para a índia contornando a áfrica), mas ele é muito chato, como só a língua portuguesa descreve, super arrogante, e ainda ridiculariza praticamente todas as perguntas dos alunos. Imaginem uma andréa piorada e sem simpatia nenhuma. Se bem que, até que os jumentos da minha sala merecem, o nível deles é péssimo e eles fazem perguntas absurdas, quase inacreditáveis para estarem naquela sala.

Não aguentei, 17 horas teve um intervalo e eu fui embora, ainda muito agoniado e querendo falar com alguém sobre meus infortúnios com o dossiê francês eu voltei pra lan house dos nepaleses, para pagar mais 50p de internete. E então eis que eu encontro a carla no msn, a carla que eu tinha catado no orcute e que chegaria aqui no sábado um dia depois de mim e de quem eu ainda não tinha tido notícias, então ela disse vem me ver estou aqui perto da estação de bayswater (west london - oeste de londres), eu pra lá eu fui.

Nos conhecemos finalmente, conversamos um pouco, comi pela primeira e única vez numa lanchonete - subway (3 libras!!!), e ainda tomei meu amado white capuccino mocha no starbucks coffee, que aqui se chama white caffé mocha, (única vez também! mais 3 libras!) e fiquei chorando depois por ter gastado 6 libras. Mas enfim, achei a carla legal, e mal sabia eu, o quanto esse encontro costuraria e mudaria meus rumos aqui em londres. Depois peguei meu metrô e voltei para a casa da peste, minha casa.

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